segunda-feira, 1 de abril de 2013

12 - Vitória - Lembranças


Acordei por volta das 03h40min da manhã (não que conseguisse dormir muito mais que isso) agarrada ao travesseiro que estava encharcado de lágrimas. E logo fiquei com raiva, achei que tinha me livrado dessa maldição, desde que tinha chegado aqui nem uma noite sequer esse maldito pesadelo tinha vindo, por que justo hoje? Era sempre o mesmo sonho, na verdade era sempre a mesma lembrança. Lembranças nunca morrem essa era a verdade e a maldita lembrança tinham voltado para me atormentar justo no meu primeiro dia de aula. Eu vinha tentando ignorar tudo durante todos os cinco meses que seguiram o “problema” e não cheguei nem perto de um bom resultado, mas não queria confrontar isso, ainda não estava pronta, preferia fingir que estava bem.
O sol ainda não havia nascido e meu quarto se encontrava na escuridão total, o cheiro do meu incenso de cravo ainda pelo ar, isso me dava uma espécie de conforto estranho. O escuro me escondia dos meus medos.
Georgia e Julie ainda deviam estar dormindo no quarto delas. As novas filhas de Tia Claudia. Julie, a menor, era uma fofa e Georgia, a mais velha, apesar de muito bonita parecia meio desolada. Só fiquei sabendo delas no dia anterior, depois da nossa seção de treinos, umas três horas antes de elas chegarem. A casa tinha espaço para mais umas cinco pessoas (sem contar com Titia, comigo e com Alex, o filho dela que estava na faculdade) viverem confortavelmente, e Claudia tinha dinheiro para adotar mais cinco e cria-los muito bem. Titia me contou algo sobre um incêndio em um ônibus, muitas mortes, crianças no ônibus, o pai das meninas morreu e ela era amiga dele. Tudo isso aconteceu no dia que me afoguei e titia resolveu que adotaria as duas e, bom, foi isso que fez, mas demorou uma semana até que tudo estivesse em seus devidos lugares e as meninas pudessem vir para cá.
Tia Claudia tinha ido buscar elas no orfanato. Quando chegaram estava tocando piano na sala de música e cantando baixo, por isso não notei a presença delas. Foi apenas quando Julie veio para perto de mim que notei que elas haviam chegado. Parei de tocar, dei as boas vindas, ajudei-as a colocar as malas no quarto e descemos para comer. Eu tinha preparado bolo de chocolate, pão de queijo e café. Acho que Julie adorou as comidas, pois comeu bem, já Georgia estava bem mais calada e comia pouco, definitivamente podíamos chegar a ser amigas um dia. Ela era realmente muito bonita, tinha cabelos longos e negros e olhos castanhos, era um pouco mais baixa que eu e Julie (apesar do cabelo castanho claro) parecia um pouco com ela. Depois Georgia subiu para arrumar suas coisas, titia começou a ler para Julie e eu subi para meu quarto, era cedo ainda, mas eu queria organizar umas coisas, ler e dormir depois.
...
Não se passaram nem 40min e desisto de tentar qualquer meditação das que conheço. Argh. Meditar já era complicado e não ajudava em nada se você não conseguia aquietar a sua maldita mente tagarela. Eu tentava ignorar as lembranças que sempre se seguiam depois do pesadelo, mas você não pode simplesmente meditar com a mente cheia de coisas que você só queria varrer para debaixo do tapete. Odiava lembrar daquilo, o motivo para eu estar em Desdém nesse exato momento.
Subi rapidamente para meu quarto e estando lá passei direto para o banheiro, acendi um dos meus incensos de cravo e fui para o box. Lavei e hidratei meus longos cabelos ondulados e fiz o mesmo com minha pele, quando acabei meu banho enrolei meus cabelos e meu corpo em toalhas que estavam lá.
Quando sai do Box e me olhei no espelho acabo tendo uma surpresa, estou bonita. Não que eu fosse feia, sabia que não era, mas nunca me achei bonita o suficiente, ter uma mãe modelo em casa não ajudou muito, ser comparada o tempo todo com ela, a obrigação de ser linda e gloriosa como ela, essas coisas eram muita pressão e não fazem bem a autoestima de ninguém. Mas o fato é que no meu primeiro dia de aula eu me senti bonita. Meus grandes olhos amarelos, apesar do pesadelo, estavam brilhantes, minha pele estava bonita, apesar de ter uma pele muito clara eu estava mais corada, algumas finas mechas de meu cabelo caiam em meu rosto. Afinal Desdém está conseguindo me deixar melhor, não totalmente é claro, mas melhor. E isso me lembrava de Catarina e Ygor, tinha uma ideia do que diriam se me vissem agora. Tinha certeza que iam ficar muito contentes, pois há muito tempo eu não ia bem, apesar de tentar esconder os que me conheciam sabiam como eu estava por dentro. A dor tinha me mudado, acho que ela muda a todos.
Estava com muita saudade dos meus amigos. Lembro quando íamos à escola, sempre juntos. Ygor passava para me buscar no carro dele e depois íamos pegar Cat.
Catarina era praticamente uma rainha da escola, com seus longos cabelos cacheados cor de avelã e mechas cor de cobre, seu corpo perfeito (e como não? Ela praticamente já nasceu fazendo ginástica olímpica), sua pele dourada e seus olhos verdes esmeralda, eu ainda não sei como viramos amigas, ela sempre foi popular demais, linda demais. Quando tinha nove anos, eu era um dos seres mais desengonçados da face da terra e ela já era linda e segura de tudo, nos conhecemos graças as nossas mães, que são melhores amigas, porém a família de Cat morava na Califórnia e tinham acabado de se mudar de volta para o Brasil, logo na primeira visita a minha casa nós nos tornamos amigas. Ela sempre escolhia minha roupa quando saiamos e me defendia na escola quando falavam de mim, estava sempre lá, sempre que eu precisava e eu fazia o mesmo por ela, Cat era incrível, uma amiga leal e sincera. Ela meio que me introduziu no mundo dela e de certa forma eu gostei das atenções em mim, sempre gostei de ter amigos a minha volta, gosto de fazer as pessoas felizes e gostei da vida que Cat me proporcionou, pelo menos antes dele aparecer e estragar tudo.
Ygor era popular também, não nas mesmas proporções que Cat, mas ainda assim popular, era um dos meninos mais lindos que eu conhecia, deveria ter em torno de 1,87m e tinha um lindo corpo atlético (resultado de anos de futebol e muay thai), seus cabelos eram cor de chocolate sedosos e lisos que faziam um contraste perfeito com a pele clara, tinha olhos acinzentados que eram incrivelmente brilhantes e os beijos dele eram quentes e doces assim como ele. Ele foi uma surpresa enorme para mim, diferente do que eu imaginava dele (um imbecil arrogante) ele se revelou um dos seres mais gentis e compreensivos da terra.  Viramos amigos quase instantaneamente depois de conversarmos um pouco, era como se nos conhecêssemos há anos, foi meio mágico. Depois de um tempo engatamos uma amizade colorida e era incrível a sincronia que tínhamos, não era nada forçado ou ciumento, não tinha cobranças nós só nos beijávamos quando era conveniente, mas éramos muito mais amigos que qualquer outra coisa. É claro que depois do acontecido nós paramos e mesmo depois que eu resolvi que não ia desistir da minha vida por aqueles momentos de sofrimento, não voltamos mais, não por falta de vontade, era mais por falta de oportunidades.
Enfim saio do banheiro e escolho a roupa para meu primeiro dia de aula: uma calça preta justa, uma regata preta e por cima dela um suéter de tricô rasgadinho cor de vinho, uma sapatilha preta e minha tiara de pérolas falsas negras, ponho meus anéis e algumas pulseiras, me olhei no espelho e quase ri, tinha ficado muito bonito, mas preto não era minha cor favorita, isso sem contar que não sou a maior fã das calças. Fiquei algum tempo decidindo se usaria ou não maquiagem, por fim decidi usar lápis de olho marrom (que segundo Cat realçava meu olhos amarelos), rímel, um blush pêssego só para não ficar branca demais e um gloss incolor. Antes de sair do quarto peguei minha bolsa de couro sintético marrom, meus cadernos na cômoda e meus óculos de sol estilo John Lennon.
Desci com meu gato Helly no colo, e encontrei titia fazendo o café. Olhei para o relógio, ainda eram 05h50min. Ela se virou assim que cheguei ao último degrau e franziu a testa.
–Vai ao velório de quem? ­– falou isso depois de se virar para coar o café e deu uma risadinha.
–Oh! Você não ficou sabendo?! – falei com um espanto fingido na voz – Estou indo no velório da minha vida social. – ela riu e pôs a garrafa de café na mesa. Eu realmente não achava isso, não tanto, até que eu tinha gostado da calma e tranquilidade de Desdém, mas minha vida não estava aqui e nunca estaria.
–Não fale assim. Você está subestimando demais Desdém. Ainda vai se surpreender. ­– ela disse séria olhando nos meus olhos e depois sorriu, eu sorri também e dei língua para ela.
–Vamos ver.
...
A escola era relativamente grande e bem velha, até que podia ter sido bonita um dia, mas os maus tratos que o clima mais os descuidos produziram foram desastrosos para a conservação da mesma. Era feita de tijolos bege(?) antigos, tinha um telhado, que deve ter sido cinza um dia, praticamente todo coberto por folhas e musgo e tinha uma espécie de torre no meio que se elevava acima do resto da escola, na qual se encontrava um relógio.
Cheguei à escola muito cedo, quase ninguém havia chegado ainda. Fui à secretaria pegar meu horário e comprar meu uniforme. Eu estava no 3° ano A e o uniforme era muito sem graça, uma blusa azul escuro e branco, com o símbolo tosco da escola, pelo menos a parte de baixo do traje era opcional, só tinha que ser algo em um tom escuro. Dirigi-me a minha sala e sentei no fundo, hoje eu queria observar meus novos colegas de classe.
Logo a sala começou a encher. Via as pessoas entrando na sala e começando a conversar, a maioria olhava para mim, mas tentava fingir que não estava olhando. Havia um garoto de cabelos negros próximo a mim, que parecia não estar na sala, seus pensamentos vagavam para um local que eu desconhecia, era um garoto bonito, mas triste; uma loira bonita e sozinha num canto, umas menininhas engraçadas que estavam tentando esconder que falavam sobre mim, uns garotos que me olhavam de um jeito que odiava e o mesmo tipo de gente que se encontra nas escolas em geral. Infelizmente descobri que Georgia não estudava comigo, e que em nas sextas ela saia mais cedo que eu, o que significa que terei de ir embora sozinha.
O sinal finalmente bateu e o professor Augusto entrou na sala. A primeira aula era literatura. Eu imaginava que a matéria da escola estaria atrasada em relação a minha outra escola, mas não tanto. Íamos falar de Romantismo, eu passei a odiar tudo que era romântico desde que tudo aconteceu. Ele escreveu no quadro duas frases de Shakespeare e perguntou de quem eram.·.
Tarde demais o conheci, por fim; cedo demais, sem conhecê-lo, amei-o.
“Duvida da luz dos astros,
De que o sol tenha calor,
Duvida até da verdade,
Mas confia em meu amor.”
Eu levantei a mão para responder, mas um menino da frente respondeu antes.
–Shakespeare, professor. –ele respondeu rápido e sem levantar a mão, só pude pensar em como ele era mal educado. Não o tinha notado antes, talvez tivesse chegado depois.
–Muito bem, está correto. –disse o professor com um pequeno sorriso animado nos lábios. –Agora, alguém aqui sabe me dizer que conceitos a primeira frase emprega, ou quer dar sua opinião a cerca desse glorioso sentimento que é o amor? – ele falou com empolgação, provavelmente por alguém ter respondido a primeira pergunta corretamente. Eu torci a cara para a última pergunta. Porém essa ninguém respondeu, ele ia voltar a falar, então eu levantei a mão, resolvi dar minha opinião. Ele fez um gesto com as mãos indicando que eu poderia falar e quase toda a turma se virou para mim.
–Respondendo a segunda pergunta, eu acho que foi a loucura, professor, o que mais motivaria alguém a falar assim? – minha voz saiu alta e clara, porém mais áspera do que eu esperava.
Eu já acho professor que quem falou esta frase estava vivenciando o mais puro e verdadeiro amor. – o garoto mal educado da frente rebateu com uma voz que parecia chocada e meio histérica ao mesmo tempo. Levei alguns segundos para poder pensar sobre o assunto, fazia tempo que eu não debatia com alguém, na minha antiga escola eu costumava fazer isso com os professores, era adorável, sempre conversei muito com eles, mas nessa escola era diferente, o garoto estava realmente discutindo comigo. O garoto, pelo que eu podia ver da minha carteira, estava usando all star, uma camisa azul e um jeans com aparência meio gasta, ele tinha os cabelos pretos e meio bagunçados e era alvo. Se ele queria discutir comigo, era o que iria ter.
Na primeira frase, por exemplo, fica explicito que eles mal se conheciam. Como pode o ''amor'' existir dessa forma? Entre dois seres que mal se conhecem. O amor por tanto não motivou nada. Talvez o desejo sim. – eu praticamente cuspi as palavras, esse garoto não sabia nada.
O amor não é um sentimento racional, ele acontece de forma que poucos sabem ou sentiram.   o garoto estava se estressando, me deu vontade de rir, a situação estava ficando divertida.
Oh, que coisinha doce você é. –falei com ironia, agora eu queria irritar ele. – Sabe professor, li num livro uma vez que o "amor" é uma coisa totalmente psicológica. Você ama o que te faz bem. Você ama o que dá prazer em você. Você nunca pensa no outro e sim nas coisas que ele te proporciona. E você consegue se provocar o amor... Tipo, você consegue se obrigar a amar alguém. A conclusão, docinho, é que o amor é algo muito mais racional do que você acha. – falei tudo isso sorrindo e fitando as costas dele eu tive de dar uma risadinha baixa, o garoto cerrou os punhos.
Se não compreende o amor, não pode ser considerada uma pessoa normal, pois o amor é o sentimento mais redentor que existe em todo o universo e o mais belo também. Ele modela as pessoas para que elas descubram tanto a si mesmas quanto aquele (a) que o cativa. Se você não sabe disso, não precisava ter nem se dado ao trabalho de argumentar. – ele falou e respirou fundo depois.
–Oh! Romeu, Romeu! Mas porque és tu Romeu? – depois de citar esse trecho de Romeu e Julieta dei uma pequena risada carregada de ironia. – Eu sei o que estou falando. É por isso que estou falando. Realmente o amor modela as pessoas, elas se tornam obsessivas, ciumentas, controladoras e – Droga, minha voz falhou um pouco. – violentas. É isso que o amor é... Um sentimento destrutivo. – o garoto não respondeu. Será que ele era tão lento assim? Decidi que iria ajuda-lo, então completei minha frase – Tenho pena de pessoas que acham que o amor muda alguém para melhor. São pessoas iludidas, que provavelmente vivem em sofrimento. Esperando o "amor" aparecer.
–Sentimento destrutivo? Pessoas iludidas? – Ele riu sem humor algum. – Você não sabe mesmo do que está falando. O amor tem realmente a capacidade de mudar pessoas para melhor, sei disso mais do que imagina. Você não sabe do que está falando.
Parece que quem não sabe algo aqui é você... Você já ''amou'' alguém, querido? Se sim sabe do que eu estou falando. Não acredite nesses livros românticos bobos. Eles são cópias da "lindíssima" idealização do amor. – Esperei que ele respondesse, tive de ajuda-lo de novo, por que a resposta não veio - Só para constar que eu não estou falando do amor de pais por um filho, ou do amor de irmãos. Estou falando do amor entre duas pessoas, do desejo carnal que há entre os dois e que as pessoas insistem em chamar de "amor".
O amor é mais que um simples desejo carnal, o amor é se preocupar um com o outro, ficar ao lado da pessoa em qualquer momento que necessitar, compartilhar momentos belos e indescritíveis juntos e sensações que te deixam sem ar, que fazem você ignorar qualquer coisa em volta e só saborear aquilo. Isso é o amor, Srta. Sei-De-Tudo-Sobre-Isso. ­–eu sorri com a resposta dele, estava tudo ficando tão divertido.
Oh, mas Dr. Do Amor, só posso pensar então duas coisas. A primeira que o senhor é muito otimista ou que o senhor nunca "amou"... Só está repetindo o que leu. Deixe-me presenteá-lo com um pouco de filosofia de vida: O amor é um jogo. Um jogo de interesse e poder. Poder sobre o outro, como tudo na vida. – eu colocava minha voz em tom de falsete e ok, eu estava pegando pesado, mas o garoto estava pedindo por isso praticamente.
Você que não sabe de nada, já que pensas que tudo relacionado ao amor é um simples jogo de interesse. Amar e ser amado são desejos de todo o ser humano com algum senso de romantismo. Que, pelo visto, você não tem em nenhuma célula de seu corpo. – ele realmente estava com raiva, eu tive de me controlar para não rir e ficar com a cara séria.
Romantismo?! Estou começando a achar que você nem mesmo leu um livro sobre amor! Já acabou de ler algum livro romântico de Shakespeare? Eles não acabam bem. São tragédias. Se o amor é tão bom assim como o senhor está discursando por que nenhum acaba bem? ­– joguei as perguntas para ele, minha criatividade estava acabando, principalmente por que ele não mudava muito os argumentos. Ele murmurou algo que não consegui entender. Tudo bem, eu iria ajuda-lo de novo. – O senhor é muito romântico, tenho de admitir. Mas isso não muda o fato de que o amor não existe. Imagino que leia bastante os livros do Nicholas Sparks, já que você é tããão romântico. – ele passou as mãos pelos cabelos, mas não me respondeu. Eu não ia deixar ele me ignorar dessa forma, na frente daqueles rostos chocados com a discussão. Então o complemento perfeito de meu discurso veio na minha cabeça e eu o disse sorrindo. –O que te motiva a acreditar no amor?  Ou será que só viu os filmes da Disney e se convenceu que o amor existe?
–É a minha vida. E são minhas crenças. Você não mudará nada. – Ele parou e pensei que tinha acabado, mas quando ia começar a falar ele completou. – Você quer que eu fale então eu vou falar: meu pai foi um idiota cretino por ter deixado minha mãe sozinha pra me criar e cresci escutando que o amor não prestava para nada além de destruir uma pessoa. Mas eu penso diferente, eu acharei o meu amor e mostrarei que ele existe sim e que ninguém pode lutar quando ele aparece. – enquanto ele falava eu cansei da discussão boba, ele não ia mudar de opinião, e os argumentos dele eram muito pessoais e os meus muito espinhosos e baseados em livros de psicologia.
–Enfim, professor essa é minha opinião. –dei um sorriso a ele que também estava tão chocado quanto os outros.
­Você não pode provar que o amor não existe! – o garoto falou e se virou para mim pela primeira vez. Não pude falar nada, eu fiquei surpresa, tanto quanto ele estava.
Foi então que vi seus olhos. Meu coração acelerou instantaneamente e provavelmente eu corei, mas mantive meu rosto com o ar de superioridade que lhe era característico. Os olhos dele estavam surpresos apesar do resto do rosto não estar. Eu conhecia aqueles olhos azuis, eu os tinha desenhado no meu caderno, aqueles olhos tinham aparecido em um sonho meu. Eu fiquei sem reação pela primeira vez em toda a nossa conversa, ele parecia do mesmo jeito. Eu não reconhecia o resto do rosto, mas aqueles olhos sim. Foi então que veio na minha mente a lembrança, aqueles olhos, foram eles que me salvaram, foram eles que me tiraram do lago. Minha mente, apesar de perturbada formou uma frase que saiu para responder a última sentença que ele proferiu. Eu era orgulhosa o suficiente para não me conter.
Você também não! – dessa vez minha voz saiu meio falhada e meio acusativa, mas alta o suficiente para que ele escutasse.
Olhamo-nos por mais alguns segundos e depois ele se virou para frente.
O professor continuou a aula normalmente, provavelmente preferiu fingir que nada havia acontecido. Sabia que muitos dos meus novos colegas de classe ainda me olhavam, com toda certeza ainda estavam chocados com a novata que fez uma mini briga com o coleguinha querido deles, mas eu não me importava, mal senti os olhares. Estava preocupada em tentar organizar a bagunça que minha mente formou, maldita consciência, mas eu já sabia o que fazer.


Por:  Letícia Cavalcante

Um comentário: